OS PENSAMENTOS DAS CRIANÇAS

George Wagner

Editora Letras

Capítulo 1

PENSAMENTOS VÃOS

Ou, o que ganharemos com eles?

Em um pequeno livro anterior falei com meus jovens e queridos amigos sobre os desejos das crianças. Neste, estou ansioso para falar com você sobre os pensamentos das crianças, sobre maus e bons pensamentos. Desejos e pensamentos não são exatamente a mesma coisa; um grande número de desejos entram em seu coração, alguns errados e outros, espero, corretos. Mas você tem muito mais pensamentos do que desejos. Davi fala da multidão de pensamentos dentro dele: “Na multidão dos meus pensamentos dentro de mim, as tuas consolações recrearam a minha alma” (Salmos 94:19). Mas você entende claramente a diferença entre um desejo e um pensamento? Talvez não. Deixe-me, então, tentar explicar. Podemos comparar nossas mentes a uma casa em que há várias salas. Em uma dessas, vive o conhecimento. A sua sala é grande e alta, e há largas janelas, de onde se tem uma bela vista, e é possível ver a uma longa distância. Em outra, habita a memória. A sua sala é uma dos fundos, e suas janelas têm vista para a estrada que leva para a casa, de modo que quando ela olha para fora de sua janela, não pode ver a frente, como o conhecimento faz; ela sempre olha para trás. Em outra sala, habita a emoção. Este é o último cômodo da casa; de fato, ele é tão grande que, embora tenha muitas vezes tido um grande número de visitantes, nunca se soube que alguma vez tivesse ficado cheio. Ele sempre pode hospedar mais. Em outra sala, você vai encontrar a vontade. Sua sala é muito menor, e está situada perto da porta da casa, de modo que a partir da sua janela ela pode ver todos os visitantes que passam por ela, e nenhum sequer pode entrar sem a sua permissão. Um grande número de visitantes vêm a esta casa, como você pode imaginar – alguns vêm para chamar o “conhecimento”, alguns para conversar com a “memória”, e alguns para ver, ela mesma a recepcionista, “vontade”. Há muitos pequenos visitantes que vêm com um passo suave, tão suave que você não pode ouvi-los, até que eles deem um uma leve batida na porta. Estes são os visitantes do conhecimento. Alguns deles, a recepcionista “vontade” não deixa entrar, outros são autorizados a entrar, e eles são levados para a sala do conhecimento; alguns ficam um tempo muito curto, mas outros o conhecimento gosta tanto, que os convida a viver ali e, embora eles saiam às vezes, nunca o deixam.

Agora, todos os visitantes do conhecimento, tanto os que ficam um curto ou um longo período de tempo, nós o chamamos de pensamentos. Mas há alguns que vêm visitar a recepcionista “vontade”. Talvez você pense que ela aceitaria todos que vêm para vê-la em particular, mas quando ela cumpre o seu dever, manda um bom número embora. Na verdade, como eu disse antes, ela aceita mais visitantes para ver o conhecimento, do que para entrar em sua pequena sala. Como chamam seus visitantes? Nós damos um nome a eles, mas você não deve pensar que são todos iguais, pois eles são muito diferentes; nós os chamamos de desejos. Você entende melhor agora qual é a diferença entre “desejos” e “pensamentos”? É sua vontade que produz os desejos, o seu conhecimento é o que que reúne os pensamentos. Seria uma coisa muito feliz, se todos os pequenos visitantes que pedem para ver o conhecimento fossem bons visitantes; muitos deles, lamento dizer, são ruins; e é sobre alguns desses visitantes ruins, que eu devo primeiro falar com você.

Você pode abrir sua Bíblia em Jeremias 4:14? Você vai encontrar alguns pensamentos mencionados lá. O que Deus diz? “Até quando permanecerão no meio de ti os pensamentos vãos[1]?”. Nestas palavras há três pontos que precisam ser explicados. Primeiro, que tipo de pensamentos se entende por pensamentos “vãos”; Em segundo lugar, o que não devemos fazer com eles – “não deixá-los permanecer dentro de nós”, e em terceiro lugar, como podemos nos livrar deles.

Em primeiro lugar, o que são “pensamentos vãos”? O que você acha que eles são? Talvez você diga: “Se algum menino ou menina pensa muito em sua aparência externa, isto é um pensamento vão”. Isto é um pensamento muito vão. Mas isso não é tudo o que se quer dizer com a palavra “vão”. Ela adequadamente significa tudo o que é vazio e inútil. Assim, os ídolos dos pobres pagãos são constantemente chamados nas Escrituras de “vãos”, porque eles são completamente vazios e inúteis, e não podem ajudar seus pobres adoradores. “Têm boca”, diz o salmista (Salmos 135:16, 17), “mas não falam; têm olhos, e não veem, têm ouvidos, mas não ouvem”. E assim Jeremias diz: Todo o homem é embrutecido no seu conhecimento; envergonha-se todo o fundidor da sua imagem de escultura; porque sua imagem fundida é mentira, e nelas não há espírito. Vaidade são, obra de enganos” (Jeremias 10:14, 15). E, assim, também o apóstolo Paulo fala dos gentios: “andam também os outros gentios, na vaidade da sua mente” (Efésios 4:17). Porque todo o seu culto e seus pensamentos são vazios e inúteis. Desejamos, que você, querido leitor, lembre-se que todos os pensamentos que são vazios e inúteis são pensamentos vãos. Agora, quando uma criança gosta de olhar para si mesma e admirar a sua própria aparência, isso é um exemplo de um pensamento vão. Mas há muitos outros pensamentos vãos além desse. Suponha agora que você se sentasse e pensasse muito sobre o que você será um dia, e faça muitos planos sobre o futuro. Bem, Deus pode designar algo muito diferente para você e, assim, nenhum de seus pensamentos e planos serão cumpridos. Nesse caso, os seus pensamentos terão sido pensamentos vãos. Conheci um menino que pensava, como muitos rapazes agora, em ser um soldado; ele costumava sonhar com batalhas e vitórias. Ele se tornou um soldado? Não. Ele tinha uma bondosa tia, que às vezes lia a Bíblia com ele, e isso o interessava muito, e então ele pensou: “Não, não serei um soldado; eu gostaria de ser um ministro de Cristo, e explicar este belo livro”. Seu pai ficou surpreso ao descobrir como todos os seus pensamentos foram mudados. E o que ele fez quando cresceu? Ele se tornou um ministro – e é ministro agora – e muitas vezes prega sobre o livro, que um dia, tanto lhe interessou, quando criança. Você vê, então, que todos os seus antigos pensamentos sobre ser um soldado foram pensamentos vãos; todo o tempo que ele passou pensando nas batalhas que lutaria, e a coragem que ele exibiria, foi perdido. Grande parte do tempo que é gasto na formação de planos para o futuro, é tempo perdido. Esses tipos de pensamentos são muitas vezes pensamentos vãos, pois eles são vazios e não levam a nada.

Deixe-me contar a você sobre outro pensamento vão. Tudo o que Deus nos disse em Sua Palavra é verdadeiro; quando você lê na Bíblia sobre o Céu e o Inferno, você pode ter certeza, que tudo é completamente verdade. Mas algumas pessoas têm pensamentos diferentes sobre essas coisas. Elas não leem a Bíblia com um espírito humilde e ensinável, para ver o que Deus diz. Elas têm seus próprios pensamentos; o que devemos dizer de tais pensamentos? Devemos dizer que são vãos.

Alguns anos atrás, um jovem pastor convidou uma senhora para conversar; a conversa logo se voltou para assuntos religiosos, e o que você acha que ela disse? Ela disse: “Oh, existem muitos caminhos para o Céu”. “Muitos caminhos para o Céu?”, disse ele. “Sim”, ela respondeu; “Não está escrito que há muitas moradas no Céu?”. “Sim”, o pastor respondeu, “mas não diz que há muitos caminhos até elas. Não é porque há muitos quartos em uma grande casa que haverá muitas portas para entrar nela. A Bíblia nos diz que há muitas moradas no Céu, mas também diz, que há um caminho, e apenas um caminho para elas, e que este caminho é Jesus Cristo”. Você se lembra, querido leitor, onde Jesus nos diz sobre as muitas moradas no Céu? Está em João 14:2; agora veja o que Jesus diz no versículo 6: “Eu sou o caminho”. Note, Ele não diz “um caminho”, como se Ele fosse um dentre muitos, mas o caminho, o único caminho para o Pai, o único caminho para o Céu. Que tipo de pensamento então era o pensamento daquela senhora? Era um pensamento vão, porque era bastante diferente do pensamento de Deus. Oh, cuide, minha querida criança, que você obtenha todos os seus pensamentos sobre Deus e Seu amado Filho, todos os seus pensamentos sobre o Céu e o Inferno, a partir das Escrituras; se não, quão inúteis eles serão – eles serão apenas pensamentos vãos.

Mas ainda há mais um tipo de pensamento vão que não podemos esquecer de mencionar. Se você tem bons pensamentos no momento errado, então eles se tornam vãos. Agora, é uma coisa boa as crianças pensarem sobre suas aulas, e não é errado elas pensarem sobre suas brincadeiras, se tiverem estes pensamentos no momento certo. Mas se você pensar sobre seus livros ou brincadeiras quando se ajoelhar para orar, então esses pensamentos, que são corretos em outras ocasiões, tornam-se pensamentos vãos. Agora você entende, espero, o que são pensamentos vãos. Eles são pensamentos de autoadmiração, pensamentos que são contrários à Palavra de Deus, e pensamentos que, embora não sejam maus em si mesmos, vêm à mente no momento errado.

Mas o nosso texto nos diz, em segundo lugar, o que não devemos fazer com tais pensamentos: não devemos deixá-los se alojar dentro de nós; pois Deus se queixa de Jerusalém: “Até quando permanecerão no meio de ti os pensamentos vãos?”

Além disso, querido leitor, esta é uma palavra muito instrutiva: Você não pode impedir as pessoas de passarem pela sua porta e janelas. Mesmo que você pense que elas sejam pessoas muito ruins, ainda assim você não pode impedi-las; e elas poderiam fazer ainda mais do que isso; elas podem bater à sua porta; e você não poderia colocar obstáculos, ou puni-las por isso. Mas, suponhamos que elas quisessem entrar e ver você, quando você estivesse ocupado, você poderia dizer: “Eu não posso vê-las agora, estou ocupado”; ou se elas fossem mais ousadas e dissessem: “Posso morar aqui?”. Você responderia: “Não, você não pode morar aqui”. Você não pode impedir que as pessoas passem pela sua porta, mas você pode impedi-las de entrar em sua casa. É assim também, querido leitor, com os pensamentos ruins. Eles podem passar por sua mente, podem bater e tentar moradia nela; você não pode impedir isso, e Deus não considera isso pecado. Mas o que você pode evitar é que eles se hospedem em sua mente. Você pode fazer a sua “vontade” fechar a porta e mantê-los do lado de fora. Se, então, minha querida criança, algum pensamento de autoadmiração bater à sua porta e desejar entrar, não admita. É um pensamento vão; sua visita, mesmo que por alguns minutos, não lhe fará nenhum bem, mas muito mal. Ele vai colocar confusão em sua mente. Será ainda pior, se você permitir que ele habite dentro de você. Ou se outro pensamento vier, algum pensamento que seja contrário à Palavra de Deus, deixe isso do lado de fora também – é um pensamento vão. Ou se algum pensamento correto vier em um momento errado, deixe de fora isso também, diga a ele: “Agora estou ocupado; sim, ocupado com Deus – não posso receber você”.

Agora, quando pensamentos deste tipo tentam ganhar moradia na mente, existem algumas pessoas que dizem para si mesmas: “Eu não vou deixá-lo morar dentro de mim; só vou recebê-lo por alguns minutos”. Mas quando ele entra, torna-se tão agradável e implora tanto para que possa ficar um pouco mais, que muitas vezes leva um longo tempo antes que ele vá embora novamente. A única maneira segura é não aceitá-los de jeito nenhum. É manter a porta sempre fechada contra todos esses pensamentos. Mas talvez você diga: “Oh, é tão difícil manter esses pensamentos vãos fora da minha mente”. Sim é, e por isso vamos ver, a melhor maneira de nos livrarmos deles. Vocês encontrarão algumas belas palavras no próprio versículo, sobre o qual eu tenho falado, que serve para explicar isso: “Lava o teu coração da malícia, ó Jerusalém, para que sejas salva”. Oh! Como e onde podemos lavar nossos corações? Vá para Zacarias 13:1 e veja: “Naquele dia haverá uma fonte aberta para a casa de Davi, e para os habitantes de Jerusalém, para purificação do pecado e da imundícia”. Deve ser então em alguma fonte aberta pelo Próprio Deus. Que fonte é essa? Se você for para Apocalipse 1:5, você encontrará a resposta: “Àquele que nos amou, e em seu sangue nos lavou dos nossos pecados”. A fonte, então, é o sangue de Jesus; e assim como o sumo sacerdote dos tempos antigos pegava o sangue de touros e cabras e aspergia o lugar santo com ele, tornando-o assim limpo, do mesmo modo deve você, querido leitor, ter o sangue de Jesus aspergido em cada parte do seu coração e mente. Primeiro, deve ser levado até a “consciência” que habita no topo da casa. Seu quarto deve ser aspergido, e então ela receberá as mais belas mensagens de cima, mais visitas de anjos do Céu, e dará à recepcionista “vontade” ordens mais urgentes para não admitir quaisquer maus pensamentos. Então, deve ser aspergida a sala onde a “afeição” habita, pois então o coração tomará parte com a “consciência” e fará cumprir seus mandamentos na “vontade”. Então, você deve levá-lo onde a “memória” e o “conhecimento” vivem, e a “memória” recordará tudo o que é bom, e esquecerá tudo o que é mau; e o “conhecimento” dirá à “vontade”: “Tenho tantos visitantes belos e graciosos agora, tantos pensamentos celestiais, que eu não desejo ver nenhum outro. Não admita pensamentos vãos”. E então, quando a “vontade” encontrar todos os outros ocupantes da casa tão mudados, tão unidos e tão sérios para com Deus, ela dirá: “Oh, lave-me também na fonte!”. E ela desejará ser uma recepcionista verdadeira e fiel na casa de Deus, prontamente aceitando cada pensamento santo, e rapidamente fechando a porta para todos os pensamentos pecaminosos, e então, querido leitor, Deus não se queixará de você dizendo: “Até quando permanecerão no meio de ti os pensamentos vãos?”

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[1] As Bíblias em português trazem, em sua maioria, a palavra “iniquidade” no lugar da palavra “vãos”. Para o melhor entendimento do texto, optamos por manter a tradução em inglês usada pelo autor.